segunda-feira, 24 de julho de 2023

Lolô e Nino

Lolô e Nino, o niño Nino.

Havia uma vila na parte sul da cidade onde habitava uma viúva, um cachorrinho, uma gata, plantas, flores e rede. Lolô a dona e o seu cachorro Nino jamais haviam ficados separados nem por um dia inteiro. Mas ela queria sair um pouco do campo e ir além fronteiras bem ali, na Argentina, dançar tango, comer bife de um boi inteiro com um quilo de batatas rústicas, beber vinhos, comer pães com azeite, azeitonas e pechinchar desconto em peças de couro argentino. Isso seria maravilhoso para Lolô, a gata Cacau poderia ficar hospedada na filha Yô. Com quem ficaria o Nino, o cãozinho arrematador? Nino ficaria na casa da tivó Marlye, afinal, ali estava seu primo cachorro, um shitsu paciente e dorminhoco, um cão imigrante do Himalaia.

Ali vivia o Otto, que por seu sossego era chamado de príncipe-monge do Himalaia. Otto era um completo felpo de pelos brancos que escorriam chão abaixo. Não pulava na cama, nunca havia mordido um chinelo na vida, ficava no colo de todo mundo, parecia sempre estar sorrindo num estágio elevado, e seu olhar era zen, como buda.

De manhã o Otto tomava sol, à tarde ele assistia a filmes com a Marlye mãe, à noite ele virava um caracol nas cobertas da Ná. Nino, o cão caos, nem vinte centímetros de tamanho, um felpo, um peludo caramelo e acinzentado, um cãozinho com apelido de demônio da Tasmânia. Outros que eram seus vizinhos também o chamavam de Ninão-Furacão 2000, por onde passava tudo se tornava um tornado.

Na primeira noite de sua hospedagem em casa de Marlye mãe, ele batia de porta em porta, pedindo um canto da cama. Fez greve de fome por um dia e meio. Ele tinha que andar no mínimo duas vezes por dia, do contrário ele não parava de latir, por ser hiperativo e ter ansiedade em grau avançado. Quando começava a latir ficava nessa permanência em longos e agudos minutos, como buzina estarrecida que rosnava garganta afora.

Nino aparentemente era um ursinho carinhoso, mas tinha expressão enfezada, olhinhos de ataque, cabeça pra frente e nariz aguçado. Certo dia bem de manhã, Ná precisou ficar com as mãos estendidas em posição de afago na cabeça de Nino, para que ela pudesse estudar sem a 5° Sonata de Beethoven em tom agudo estridente em ré menor no latido interruptamente.

Certa manhã com Ná na piscina, o Taz chegou correndo feito uma raposa, em direção ao pomar que ficava metro abaixo. Ná num grito generoso, parecendo uma militante, fez Nino parar imediatamente um palmo diante de um propício acidente com patas de cachorrinho de cor e saltos feito raposinha num planeta só dele, e claro, de Lolô. Às vezes o cão ficava arranhando a porta de entrada, farejando de canto em canto, olhos arregalados, atinado, em desespero procurava por sua dona e companheira fiel.

Ná perdeu na corrida de Nino levando-o para passear, ela cansou, mas percorrer dois mil metros acima não satisfez a angústia da demora de Lolô e o animalzinho da Tasmânia esperava então pela sua hora de passeio no fim da tarde.

Ao acordar de manhã, Ná se deparou com Taz e o preparou para ir embora, lembrou que sua dona-mãe Lolô já havia chegado e ele já ia pra casa.

Ná colocou água para ferver, abriu o portão para o piscineiro, escovou os dentes, lavou o rosto, sentou para tomar café...Tudo muito gostoso numa manhã ensolarada e aconchegante de inverno, quando tivó Marlye falou assim, psiu, o Nino já tá na casa da Lolô.

Como assim? Urso enfezado havia saído por um vão entreaberto do portão. Chegara ofegante na casa de Lolô, essa, de cabelos em pé! Nino!?! Nem deu tempo de ela saber direito o que estava acontecendo, quando tivó recebe outra ligação, era Lolô dizendo que Nino havia fugido, saíra correndo morro acima. O Nino percorreu o planeta, deu volta ao mundo em quinze minutos, foi mais que um foguete feito luz, e reapareceu veloz como um piscar de olhos diante de sua dona e companheira fiel. A bronca ficou com tivó e Ná que deixaram o pequeno Nino sair. Mas tudo bem, afinal, cuidar de um ursinho enfezado com codinome de demônio da Tazmânia não era tarefa fácil.

Mas foi uma boa vivência, um bom fim de semana, dias repletos de uma rapozinha saltitante, com a garganta saindo pelo latido. Ainda bem que ele chegou em ótimo estado na casa de sua dona Lolô. Deve ter chegado com um pouco menos de garganta no grito, talvez tenha aprendido a ser menos ansioso com o Otto, imigrante do Himalaia. Mas Nino na verdade, seria sempre ele mesmo, o próprio cão da garganta enguiçada como gralha-azul, em posição de ataque e olhos de rapina, como se fosse dar uma voadora no pescoço de alguém, aquele cãozinho que pede atenção em todos os momentos da mãe, e late em dó maior como uma criança no supermercado que faz birra, deita, rola no chão e berra para receber em troca disso, doces e chocolates. Nino, Nino, niño...niño Nino.





Nenhum comentário:

Postar um comentário

A ditadura de anticristo se chama Revolução da Luz

Busquei a coragem do lado de fora do quadrado, que era a janela pequena do quarto azul e gelado, algumas mulheres, Escabosa, e uma órfã. A t...