Nascido em 1912 nos Estados Unidos, John Cheever foi um contista cujos contos
são até hoje considerados um fenômeno editorial. A revista “Time” referiu-se às
suas obras como uma das mais importantes no mundo atual, o “New York
Times” descreveu-as como um dos maiores acontecimentos na literatura inglesa e
já foi chamado de Tchekhov americano pelo seu talento, não que isso seja uma verdade, pois o escritor russo é único em sua literatura. Morou em um bairro de
classe média alta em Nova York, casado, rico, vindo de família anglo-saxã e puritana,
se orgulhava de ser descendente de uma linhagem aristocrata. Ele mesmo escreve
que havia herdado “o nariz, a cor branca da pele e a promessa da longevidade”,
por conta do sangue aristocrata. Mas depois de sua morte, sua história de vida
verdadeiramente se desvelou, e seu público elitizado e conservador
descobriu por meio de seus diários , que totalizavam 29 cadernos, a
verdade de John Cheever: possuía uma vida demasiadamente ambígua. Muito
distante de ser o homem branco de classe alta, aristocrata, modesto, pai de
família, com casamento duradouro e exemplo para seus leitores da elite,
revelou-se em mais de 4 mil páginas de diário que era na verdade, angustiante,
alcoólatra agressivo, um verdadeiro demônio em forma de homem que atormentou a
mulher e os filhos, abusou de dezenas de amantes de ambos os sexos e escondia
dos círculos sociais sua homossexualidade. Além de que seus diários revelaram
uma relação incestuosa e carnal com seu irmão mais velho. Apesar de ter sido
considerado um talento inato e revelação na literatura inglesa, era também
visto como medíocre e esnobe pelos mais próximos. E com a publicação de seus
diários depois da sua morte, leitores e admiradores do inestimável conservador
aristocrata ficaram horrorizados e perplexos com a revelação da sua
homossexualidade, do alcoolismo, dos abusos, do mundo obscuro da sua vida e de
sua família ao redor. A obra bibliográfica causou repúdio, descrições em
detalhes de cenas de sexo e abusos, o seu ódio aos homossexuais, apesar de ser
um deles, o tormento na vida da mulher e dos filhos, sua máscara de homem
alegre, da boa vida em família e de suas virtudes caiu pesadamente no chão.
John Cheever é um dos grandes exemplos a serem tomados por nós de que não se
deve permitir a ilusão das aparências, da fala, da boa oratória, da riqueza,
das grandes casas, da aristocracia, do sangue nobre, da fama ou do sucesso de
alguém. Vivemos hoje em um mundo de deslumbramento total, o pior homem do mundo
se torna digno quando está cheio de dinheiro, mas é difícil a gentileza na
simplicidade. O nosso sol se tornou o glamour dos bens materiais, mas como na
verdadeira história de John Cheever, esse sol pode esconder uma obscuridade
inimaginável. A verdade é que seria muito melhor para nós que pudéssemos
enxergar desde o início da vida a alma e o coração dos outros, além do sorriso,
do sucesso e de todas as artimanhas que oferecem. Conhecer a história de John
Cheever me deu medo, me fez desconfiar de coisas que são estabelecidas, ou que
aparentemente são conservadoras demais, e me deu muito mais medo dos preconceitos.
Me causou ainda mais repúdio de pessoas violentas e da demagogia, pois a pessoa
que odeia é o próprio ódio em si mesma. John Cheever quando é desmascarado por seus próprios
diário depois da morte se tornou um grande exemplo do que não ser. Estabelecer
clareza nos nossos sentimentos e maneira de pensar ajuda tanto a nós mesmos
quanto o próximo que precisa de luz no caminho. Essa luz não é do sol, nem da
fama, nem das riquezas, é a luz que brilha de dentro e sai refletida na
transparência dos olhos.
quinta-feira, 20 de janeiro de 2022
A ilusão das aparências do escritor aristocrata
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